16/09/2013


Medicação ou medicamento?

Simônides Bacelar, Hospital Universitário da Brasília, Universidade de Brasília

Bons dicionários como o Aurélio (2009) e o Houaiss (2009) atualmente trazem esses nomes como sinônimos. Por ser de amplo uso a sinonimia tem legitimidade. Contudo, pode criar ambiguidades que, em textos científicos, constitui grave mazela, por poder levar o leitor ou o ouvinte a interpretações equívocas. Um relato médico em que medicação ora significa medicamentos ora indica o ato de medicar e mais adiante, o efeito da medicação, pode encerrar obscuridade, despadronização e confusão.

A frase “O paciente recusou a medicação intravenosa”, por exemplo, é ambígua. Não se faz claro se o paciente recusou a droga ou sua aplicação. Ficarão clarividentes os sentidos se as construções forem: O paciente recusou a medicação (ou a aplicação) intravenosa do medicamento (porque a seringa não era descartável). Ou: O paciente recusou o medicamento de aplicação intravenosa (por ter alergia a um de seus componentes).

Em rigor literal, medicação significa ato (realizar a medicação) ou efeito de medicar (estar sob medicação) e emprego de agentes terapêuticos para atender a determinada indicação (Dic. Larousse, 1992), assim como o sentido próprio de prescrição é o ato de prescrever e o de operação, o ato de operar.

Medicação significa, propriamente, terapêutica, terapia, medicamentação, como está nos dicionários de português e, em grande número deles, registram-se apenas essas acepções; inclui a aplicação de qualquer meio terapêutico (Dicionário Cândido de Figueiredo, 1996; Dic. da Língua Portuguesa, de Antenor Nascentes, 1988), como soro morno, panos quentes, raios ultravioleta, radioterapia, massagens. Assim, estão corretos os dizeres: evitar automedicação, erro de medicação, prescrever medicação a ser feita, medicação parenteral, calcular a medicação.

São medicamentos as substâncias usadas para tratar doenças (Dic. Aurélio, ob. cit.), como remédios, drogas, fármacos, agentes terapêuticos. Tais distinções são registradas em máximos dicionários de sinônimos como o de Francisco Fernandes (1997) e o de Osmar Barbosa (1996) e nos dicionários Aulete (1980), Michaelis (1998) Universal (1999) e outros.

Assim, medicação é substantivo abstrato e medicamento, substantivo concreto. Por isso, embora tenham vasto uso, o que também, como já citado, lhes dá legitimidade, são imperfeitas expressões do tipo: “comprar a medicação” “este fármaco é ótima medicação”, “tempo para correr a medicação”, “atraso na administração da medicação”, “O éter é ótima pré-medicação”, “Foram administradas 3 medicações” e similares.

Por amor à precisão e à busca da perfeição, na linguagem científica formal, é desejável mudar a construção. Em lugar de: “Paciente tomou toda a medicação”, diz-se: Paciente tomou os medicamentos. Em vez de: “Vim buscar a medicação”, usa-se: Vim buscar os medicamentos.

Por ser comum no âmbito médico, não há de ser incorreto o uso de um dos nomes pelo outro, sobretudo em linguagem coloquial, mas usar esses nomes em seus sentidos próprios evitará comentários adversos além de denotar linguagem mais cuidadosa.

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